Flutuar.
Verbo intransitivo. Em outras palavras, vociferar independência sujeitado às
amarras de um sujeito indeterminado. Um sinônimo: voar.
Em meu voo,
flutuo. Acorrentado. A quem?
Meus olhos se
movem sobre os grilhões, como que tentando localizar a vida a eles atribuída de
tempos em tempos. Meu mestre (no presente). Minha verdade (no agora).
O ovo quebra. O
sol nasce. Dalí, pássaro se espanta.
Sobrevoo-o sendo
auxiliado pelos traços de um balão algodoado. Céu cheio. Céu nublado.
Subitamente,
as amarras ferem-me o flutuar. Caio no descaso em meio ao acaso. Caio no mar.
Torno-me
homem e nau. Marionete de artistas de outra era. Ergo-me em busca do ar. Acabo
por encontrar cordas e velas que impõem velocidade ao meu corpo. A metamorfose
do tempo presente corrobora a transmutação do morto em matéria viva. E somente quando as velas atreladas ao mastro, que de minhas costas nasce, tornam-se
borboletas prontas para alçar voo, transformo-me em caravela. Óleo sobre tela.
TERRA À VISTA!, bradam as borboletas com
o farfalhar de suas asas.
Nas
Dunas.
Encalhei.
Sozinho.
O pano se
levanta. A maré abaixa. O deserto se alimenta. Não resta nada.
O anacronismo do
nada edifica a história do infinito. Aloca-se o efêmero indivisível em forma de
massa de modelar. Violinos, canhões, cavalos e sensações. Relógios da ausência
do tempo derretendo. Alterando seus ponteiros em forma e tamanho. A alomorfia
do objeto passa a ser a eterna certeza de indivisão.
Deformar toma
forma em um rosto vazado. Dos orifícios, o repetir de imagens grita
sensibilidade. Sentir o medo do constante. A visão de rostos carregados de um
olhar inexpressivamente expressivo. De novo. E de novo. E de novo. Amedrontado,
dou alguns passos para trás. Percebo o derreter de minhas pernas. Tropeço.
Levanto. Derreto. Desmaio.
Inconsciente do
mundo concreto, desperto.
TVUUU! TVUUUUUU!! TVUUUUUUUUU!!!
Tubas. Tumbas.
Tumbas. Tubas.
Olho o corte. O
corte no olho. A cisão completa.
Agora posso ver.
O andar dos
gigantes sobre a terra. Sonoro titubear de tubas. Particular heterogeneidade de
cores animais. O cinza selvagem e o dourado civil. O paradoxo de um dissidente.
A sobreposição
de imagens ao meu redor configura uma realidade abstrata. A miragem sensorial.
A cena que exala o odor do real.
Atravessadas as
tumbas, deixo pra trás minhas prévias verdades. A quietude do verde pasto adiante me comove. Altas e firmes, pregadas em grandes estruturas cônicas
encontro minhas borboletas. Perdera-as no mar, mas elas encontraram seu caminho
para a terra. Ah, estão em moinhos afinal! Moinhos nesta campina, que dependem apenas
delas para funcionar. Afinal, presas ao chão minhas asas estão a voar.
Porém há uma
longe. Ao longe de tudo.
A borboleta
solitária. Díspar. Sem amor. Sem carinho. Sem corpo.
Salvador.
Encorpado. Caminho até a solidão. Sem uma palavra, enlaço-me a ela e perpetuo-me
no casulo da nova era. Páginas correspondem à cama de que um dia me utilizei.
Durmo em livros que um dia salvarei.
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